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Impaciência Crónica

Crónicas quinzenais sobre temas diversos e profundos, mas mais pró leve.

Impaciência Crónica

Crónicas quinzenais sobre temas diversos e profundos, mas mais pró leve.

O defeito "que nem é bem defeito".

Tms, 15.04.24

Um defeito? Sou perfeccionista.

Acho que deve ser o defeito mais mencionado quando falamos de nós próprios, especialmente se for numa entrevista de emprego. É um defeito que fica sempre bem, porque é associado a brio, atenção ao pormenor ou, no pior dos casos, só a ser-se "picuinhas".

Percebo que, quando digo que sou perfeccionista, as pessoas ouvem "gosto de fazer um bom trabalho", quando na realidade quero dizer "considero-me um bocado de excremento mole, a menos que cumpra estes objectivos (que, segundo me dizem, são) demasiado altos, aos quais chamo de 'mínimo'". Quero dizer que me esqueço de comer ou dormir até limar todas as arestas, corrigir todos os erros e colmatar todas as falhas que conseguir encontrar no meu trabalho. Quero dizer que, quando não encontro mais falhas, não acho que fiz um bom trabalho, mas fico apenas com receio de me ter escapado qualquer coisa. Quero dizer que sou incapaz de aceitar qualquer elogio ao meu trabalho, porque fico sempre a pensar que podia ter feito melhor, mesmo não sabendo como. 

E sim, sei que o perfeito não existe e por isso estou numa busca vã. Saber isso não ajuda, uma vez que não estou a falar de um comportamento racional, mas sim de um defeito. É um comportamento que, apesar de tentar gerir, tenho dificuldade em evitar. 

Ou se calhar sou só "picuinhas", sei lá.

Vemo-nos por aqui.

Engana-me, que eu gosto.

Tms, 01.04.24

Eu não sou grande fã da mentira corriqueira, nem como produtor, nem como consumidor.

Claro que não sou nenhum santo e já menti, mas não me lembro de extrair grande prazer, nem do processo, nem do resultado. Para ser honesto, sempre me pareceu bastante triste e trabalhoso enaltecer-me a mim ou à minha vida através do engodo. Para quê ter a fama se não posso ter o proveito?

Também penso que não haja muita gente que goste de saber que foi ludibriado, ou pelo menos não se gabam muito disso. Mesmo as chamadas "mentiras boas", serão assim tão boas, ou estarão apenas a perpetuar personalidades tóxicas ou, talvez ainda pior, capachinhos?

Eu até gosto muito de ser enganado, mas apenas quando já sei à partida que me querem enganar. Avisem-me primeiro que, na maioria dos casos, até me esforço para me deixar enganar. Estou a falar de filmes, séries, livros, peças de teatro e, até, espectáculos de magia. Há um acordo tácito de que eles fazem aquilo para me enganar, eu sou enganado, e ninguém se chateia. Bom, quase ninguém. Já todos tivemos um momento de "epá, era impossível o gajo sobreviver a isto" num filme em que aceitamos dragões com cara de unicórnio e patas de framboesa. A suspensão da descrença não cobre tudo, vá-se lá saber porquê.

Vemo-nos por aqui.

Ligações anónimas

Tms, 15.03.24

Eu não atendo números desconhecidos. 

Nem é só quando aparece "número desconhecido" no ecrã, eu simplesmente não atendo qualquer número que não conheça. Causa-me desconforto quando o telemóvel toca e vejo uma sequência de dígitos que não reconheço, como se estivesse numa casa de banho pública e começassem a bater à porta. Sei que não sou o único nesta situação (quiçá por ser bué jovem), mas acho que A CULPA É DESTAS MALDITAS NOVAS TECNOLOGIAS (ok, talvez "jovem" seja algo exagerado).

Na minha juventude cheguei a experienciar algumas barbaridades, como o uso do telefone fixo, em casa, para realizar e receber chamadas. O nosso primeiro telefone nem ecrã tinha, por isso não havia qualquer maneira de saber quem nos estava a ligar até, de facto, atendermos. E atendíamos, sempre na esperança de ser algum familiar ou amigo, esquecendo todas as (não muitas) outras vezes em que ficámos demasiado tempo presos na conversa de um telemarketer. Era uma roleta russa, no sentido em que gostariamos de dar um tiro na cabeça quando ouvíamos um "era possível falar com o responsável pela **** aí de casa?".

Mas a tecnologia evoluiu e mimou-nos com informação. Agora é possível ver se quem nos liga é realmente um familiar ou amigo, sem ter de atender. Isto aliado ao facto dos scams e spam telefónico serem cada vez mais, não dá vontade nenhuma de atender alguém que não seja uma das 5 pessoas com quem quero falar. Tornou-se mais conveniente não atender, até porque depois até posso ver no google que informação há sobre o número. É importante? Envie um e-mail. É urgente? Envie uma sms. 

Eu não me estou a queixar. Só estou a dizer que, se me ligarem e não vos atender... culpem a tecnologia.

Vemo-nos por aqui.

Com um grande poder, vem grande ociosidade.

Tms, 01.03.24

Sejam sinceros: se ganhassem um super-poder, tornar-se-iam super-heróis?

Quantas vezes não gostaríamos de ter o poder de tele-transporte, não para salvar o mundo, mas apenas para não ter de apanhar chuva quando é preciso ir a algum lado? Quantos fãs de Harry Potter não desejaram poder exclamar Accio, apenas para apanhar o comando que ficou na mesa, quando se sentaram no sofá? Todos sabemos a primeira coisa que fariamos, se nos tornassemos invisiveis...

Eu diria que a maior parte das pessoas, onde também me incluo, iria usar o seu novo super-poder para facilitar a sua vida, e não para a complicar mais. É como o pessoal que ganha o euro-milhões e nem à família quer contar, porque se dão a uns, têm de dar a outros, e já agora ao melhor amigo e ao que tem "uma boa ideia para um negócio" e NUNCA MAIS ACABA! Começamos por voar a tia ao centro de saúde e acabamos a levar a familia toda à Disneyland Paris, só para não dar dinheiro à TAP.

Um super-poder não nos torna super-heróis nem super-vilões, e está tudo bem. A maior parte dessas personagens vive numa realidade à parte dos comuns mortais, onde não tem de se preocupar com o mundano. São milionários, ou ligados a milionários, ou são seres interdimensionais invulneráveis, que nem precisam de comer! 

Qual era o super-poder que facilitaria mais a vossa vida? Eu gostaria de provocar diarreia explosiva instantânea em quem quisesse. Está estacionado em segunda fila, a impedir o transito? Toma lá diarreia explosiva! Está a usar o telemóvel no cinema? Toma lá diarreia explosiva! Tem prisão de ventre? Toma lá diarreia explosiva! MUAHAHAHAHAH!

Vemo-nos por aqui.

 

É da idade...

Tms, 15.02.24

Está próximo o dia em que completarei 35 anos de vida e acho que surge a questão: estarei velho?

Os mais velhos dirão que não, mas os mais novos dirão que sim. Ambos podem concordar que poderei estar demasiado velho para algumas coisas, mas também ainda não tenho idade para outras. Isto aplica-se a qualquer idade, por isso fico na mesma.

Sozinho também não consigo perceber. Visto-me como quando era jovem, tenho os mesmos interesses de quando era jovem, mas não me comporto como quando era jovem, maioritariamente derivado de "isto vai dar merda" ou "não tenho energia para esta merda".

As revistas de lifestyle dizem que os 30 são os novos 20, mas com 20 anos não acordava com dores nos ossos e tenho a certeza que tinha mais cabelo no cocuruto. Eu também achava que "a idade é só um número" até fazer 30 anos e começar a grunhir de esforço cada vez que me levanto do sofá. 

A verdade é que nunca fui tão velho, mas gosto de me lembrar que nunca mais voltarei a ser tão jovem como hoje. Tenho de admitir que é de aproveitar.

Vemo-nos por aqui.

Carta aberta aos meus heróis

Tms, 01.02.24

Caros heróis (não vos irei mencionar pelo nome, para os outros não ficarem tristes),

Gostaria de começar por vos agradecer por todo o vosso trabalho até hoje, que tanta alegria e inspiração me tem trazido ao longo dos anos. Espero genuinamente que continuem por muitos mais!

Ouço atentamente cada palavra que proferem e ambiciono ser como vocês, mas só as partes que eu gosto, que as outras maçam-me um bocadinho. Isto de serem humanos, com defeitos, é meio "meh" para mim. Seria possível não serem assim (pergunta sincera)?

Eu compreendo que, hoje em dia, haja uma pressão social e, principalmente no vosso caso, profissional de criar muito conteúdo para a internet (conteúdo esse que aprecio bastante, na sua maioria) mas isso abre portas a algumas (pequenas) incongruências.

Um exemplo *coff--Ricardo Araújo Pereira--coff* é negar que as palavras possam causar dor. Podem não causar dor física, mas podem causar dor emocional. Parece-me apenas lógico concluir que: se as palavras, numa determinada ordem, podem provocar uma reacção involuntária chamada riso, também podem provocar outras reacções involuntárias mais desagradáveis. Aceitar essa lógica simples não significa que se esteja a assumir a intenção de magoar as pessoas, é só uma consequência possível.

Outro exemplo é de quem diz dizer aquilo que não se diz *coff--Bruno Nogueira--coff*, mas parece que ocupa parte desse espaço com parêntesis. Muito "Claro que com isto não quero dizer..." ou "Com isto não me estou a referir a...". O cumulo, para mim, é a edição (rara, felizmente) após a publicação. Uma story, que passado uma hora tem um texto ligeiramente diferente, ou até mesmo um episódio com uma secção removida, com uma desculpa de "O outro link deu merda". Um verdadeiro stalk--FÃ! eu queria escrever fã-- repara nessas coisas.

Percebo que isto sejam respostas ao público de hoje em dia, mais vocal e (penso ser o termo técnico) choninhas. A solução é simples: não se pode agradar a todos, por isso peço que se foquem apenas em agradar-me a mim.

Obrigado e

Vemo-nos por aqui.

O Calendário dos bons momentos

Tms, 15.01.24

Há uns anos atrás, depois de um problema de saúde, tive uma depressão. 

Afastei-me dos amigos, saí do emprego onde estava e tinha muitos dias em que nem conseguia arranjar coragem para sair de casa. Sentia-me completamente perdido, impotente e (claro, o clássico) sentia-me mal por me sentir tão mal, como se não tivesse direito a tal.

Foram tempos difíceis e confusos, não só para mim mas também, reconheço, para todos próximos de mim. Andava com os nervos à flor da pele, com o coração na boca, e a minha família não sabia, muitas vezes, como iria reagir quando me abordava. Sinceramente, nem eu.

Felizmente isso não os demovia nas suas tentativas de me alegrarem. A minha namorada, com quem já vivia na altura, tinha sempre planos para me tirar de casa. Eram passeios, comer fora, cinema, etc... E resultava! Até ao dia seguinte, pelo menos... A depressão era rápida a apagar não só a pouca alegria até aí obtida, como também a memória desses eventos, deixando-me a olhar para trás e ver apenas uma névoa de desânimo. 

Foi então que decidi criar aquilo a que chamei "O Calendário dos Bons Momentos"!

Arranjei um calendário, daqueles com "casinhas", e comecei a pintar de cor viva  o quadrado correspondente a cada dia em que houvesse algo que me animasse: um lanche fora, encontrar um amigo, o que fosse. Se sentisse que algo, naquele dia, me tinha trazido um pouco de alegria, pintava o quadrado (e escrevia uma ou duas palavras para ajudar a lembrar o momento).

Semana após semana, o calendário começou a ficar cada vez mais colorido, relembrando-me diariamente dos bons momentos passados e dando-me esperança de que haveriam muitos mais no meu futuro.

Anos depois, e depois de muita psicoterapia, posso dizer que tenho mais dias bons do que maus. A quem se rever neste texto: não hesitem em pedir ajuda profisional, é um processo difícil e moroso, mas as coisas melhoram.

Vemo-nos por aqui.

 

Esta será, provavelmente, a minha última crónica.

Tms, 01.01.24

E é uma pena, porque também é a minha primeira crónica e até acho que isto, com alguma prática, tinha potencial para ser giro. Este não é um caso de "os últimos são os primeiros" ou vice-versa, mas um reflexo da minha falta de auto-confiança.

Há uns anos surgiu-me a ideia (extremamente original) de escrever sobre temas diversos e profundos, tais como - inserir lista de temas diversos e profundos, mas mais pró leve - e comecei a apontar notas no meu caderno, decidi-me por um nome... mas também rapidamente começaram a surgir dúvidas e receios.

Conseguiria eu escrever algo de interesse ou, no mínimo, que entretivesse? Se sim, conseguiria fazê-lo regularmente, com ideias frescas ou, há falta de melhor, à temperatura ambiente? Mas quem é que ainda lê blogs?.. Estas dúvidas que, durante tanto tempo, me impediram de começar este blog, persistem ainda hoje.

Acredito que sejam pensamentos comuns e transversais a várias áreas da vida. Quantas vezes não desistimos antes de começar, demovidos pelas dúvidas e receios que insistem e persistem. Medo de falhar, medo de nos expormos ao ridiculo... No fundo, medo de demonstrar vulnerabilidade e sairmos magoados. 

Neste caso, e apesar de tudo, persiste também a vontade de escrever, por isso... aqui estou eu! (gritou ele ao mundo, que respondeu com uma indiferença ensurdecedora.)

Que esta seja a minha última crónica no sentido de que é a mais recente.

Vemos-nos por aqui.